3/01/2007

Óscar para Melhor Filme Estrangeiro I

O argumento de As Vidas dos Outros é de uma profundidade que não está ao alcance dos mestres norte-americanos. A humanidade da história, a relação entre as personagens, o entrosamento lento da intriga, é tudo dum simples e despretensioso que escapa à superficialidade dos sentimentos ora heróicos, ora trágicos, chapa 4 do cliché, do cinema americano. Há, nestes filmes – de todos os idiomas de leste, neste caso alemão –, em que a língua nos dificulta a entrada no filme, uma evolução das personagens diante dos nossos olhos que parece feita em tempo real. Como é costume, o filme não nos agarra desde o primeiro instante. Mas uma vez apanhados na teia, como se interpretássemos uma daquelas personagens, a história toca-nos irremediavelmente.
Quando o muro de Berlim caiu, uma obsessão de transparência impôs-se quase como nova forma ditatorial, em arquivos com as pastas de todos os casos investigados pela polícia secreta. As cinzas desse tempo ainda se sentem. Na Hungria, a terra inspira-nos solidão, o seu cheiro lembra um povo triste, faz-nos desconfiar de uma máfia que espreita em cada esquina. Em Portugal não. Estado Novo para trás das costas, desconfio que não sejamos talhados para esses regimes. Ou então digo-o por ser a minha terra – a nossa, porque o colectivo me comove. E o amor não nos deixa ser objectivos.