7/19/2005

A excepção indiana

O Bush foi à India. Até aqui, óptimo: para quem nunca saiu do Texas até ao fim do milénio, estas viagens só enriquecem a mui nobre alma presidencial. Mas certas viagens presidenciais causam em mim, volta não volta, algum espanto. (Ainda não digeri bem a visita do Lula ao Kadafi.) Pois bem, voltando ao Bush, parece que a sua visita a Nova Delhi está a causar celeuma em Washington DC e noutros pontos (até mais civizados) do mundo (dito) civilizado. É que a visita serviu para a administração norte-americana comunicar que passará a partilhar com a India tecnologia nuclear. Mas perguntam os senhores leitores: "Mas a India assinou o tratado de não proliferação nuclear? O tratado que pressupõe que os avanços nucleares sejam supervisionados pela agência competente?". Ao que se responde: não. Um rotundo não. E volta o leitor: "Não estou a perceber. Então os americanos condenam qualquer avanço nuclear, mesmo aqueles que se inserem num quadro do Tratado, e agora vão cooperar com a India?". Outra resposta rotunda: sim. Então é assim: o sr. Bush, sempre bem aconselhado (mesmo com o Karl Rove entregue à bicharada), decidiu que a India é o aliado do momento na região e a lógica desta "cooperação" é travar o crescente poder da China e diminuir a força japonesa. Assim, a melhor maneira para lograr os sues intentos é cooperar nuclearmente com a India. Esqueceu-se o sr. Bush foi de uma coisinha ou outra. Existe, há já uns anos (ninguém o avisou, será?) um grupo de 40 nações que costumam reger em conjunto as questões nucleares. Ora o Bush nem perguntou o que essas (porra, também são só 40!) nações pensavam do assunto. O sr. Bush também se esqueceu de outro assunto pequeno: é que, após o 11 de Setembro, o Paquistão é um dos principais aliados de Washington na "guerra contra o terrorismo". Ora talvez o Musharraf não ache muita graça a esta nova dança de amigos. Finalmente, uma só constatação: o mundo vai achar muita graça a esta excepção. Bush não percebeu que em matéria de armas nucleares não se brinca e abriu um precedente que vai dar que falar nos próximos tempos. Afinal, ele percebeu mal toda a lição do Afeganistão talibã. Pensará ele que combater os inimigos que a sua própria nação armou é um raio que jamais cairá no mesmo sítio?